Enquanto ouço o som aflito
dos periquitos que perderam seus ninhos para onze torres de concreto, como
escrevi em minha crônica “DA VARANDA DE MEU APARTAMENTO...”, me pego pensando
como eram lindas as catraias coloridas que levavam e traziam pessoas de um lado
para o outro em nossa Manaus entrecortada de Igarapés! Eu as olhava e não entendia
que todas se moviam pela força do braço dos homens que remavam...
Em Manaus, havia muitos
igarapés limpos, largos e sem lixos derramados. Um dos mais lindos que conheci
e tive o prazer de freqüentar e nele tomar banho era o do Parque 10 de
Novembro, poluído e desativado mais tarde e aonde se localizava a casa de
madeira do ex-governador Álvaro Maia, depois transformada em Fundação e hoje
demolida.
Manaus está ficando sem
memória histórica recente porque nada se preserva para as novas gerações.
Depois disso, tudo ao
redor, passou a ser chamado de Parque 10 de Novembro: o conjunto feito pela
Cohab-Am, o Centro Comunitário que leva o nome do ex-prefeito Coronel Jorge
Teixeira, mas ninguém o conhece por esse nome, enfim. Já disse: o progresso
caminha junto com a degradação ambiental!
Alguns igarapés ligavam bairro a bairro e todos corriam livres, leves e
soltos em seus destinos, desaguando no Rio Negro.
Alguns ligavam os bairros
mais distantes, pela quase total inexistência de pontes. Uma das primeiras pontes a que se tem notícia
é a Benjamim Constant, construída no período de 1892/95 e inaugurada no Governo
do Coronel Eduardo Ribeiro. A obra foi supervisionada pelo engenheiro inglês
Frank Hirst-Hebblethwait.
Hoje, com o progresso e a
falta de consciência cidadã de parte da população, os igarapés adoeceram,
alguns foram aterrados, outros desapareceram. Os poucos que ainda restam, estão
totalmente poluídos, doentes, mesmo os que receberam obras do Prosamim, mesmo
ficando bonitos, continuam doentes, poluídos, cheios de lixo porque uma coisa é
construir; outra é mantê-los limpos!
Eram lindas as catraias
multicoloridas, empurradas por remadores fortes, geralmente sem camisa ou com
camisas sem mangas e emprestavam aos igarapés um ar de bucolismo, alegria e
festividade constante. Hoje, pontes ligam os bairros e nenhuma catraia foi
preservada como relíquia de nossa história.
Ainda ouvindo o desesperado
canto dos periquitos nas árvores, escrevendo de minha varanda, retorno ao tempo
e lembro-me das carroças que eram nosso meio de transporte, dos carros WW, fuscas com calotas arredondadas. Também não me esqueço da “Voz Praiana”, do locutor Kimura
que saudava a todos que chegavam em Manaus com sua voz imponente e bem postada,
do badalar do sino da catedral e do relógio municipal, que tinha como guardião
o relojoeiro que alugava sua parte inferior.
Agora, lembrei-me o que
vivi na minha infância e adolescência: vendia picolés, cascalho em tambores,
jornais nas ruas, velas em portas nos cemitério de Manaus. Lavava carros,
vendia bolachas dentro de motores. Muitas vezes entrava em um motor no porto de
Manaus já sabendo que ele faria uma nova parada no porto da Panair, em homenagem
a empresa Panair do Brasil S/A, companhia aérea pioneira no Brasil, criada como
uma subsidiária da norte americana da New York-Rio-Buenos Aires (NYBRA),
incorporada em 1930 pela Nybro do Brasil, tendo seu nome modificado para Panair
do Brasil, em referência à empresa controladora, a Pan American Airways.Todos
os hidroaviões pousavam naquele local próximo a Manaus, entre o Aeroporto
Ajuricaba e o Centro da cidade.
Sempre ficava atento à
partida do motor regional, mas quando não dava tempo de desembarcar, seguia
tranquilamente e descia no outro porto. Lá, ou pegava motor rumar para o porto
de origem ou ficava na Panair mesmo, mas vendia pouco. Sempre dava certo!
Relembro o bairro da
Betânia, ainda sem ruas, água encanada, luz elétrica, cheia de pés de caju,
tucumã e que se chamava Nova Betânia. O
bairro era um grande areal e foi loteado e vendido. Lembro-me das cacimbas de
águas límpidas e muito mato em frente da casa de meus pais, onde corria e me
escondia em nossas sempre animadas, despretensiosas e infantis brincadeiras de
crianças.
Visitei mentalmente a Rua
São Benedito, quando corria, no Morro da Liberdade, primeiro local em que
passei a residir na casa de meus padrinhos, Natércia e
Januário Calado. Ela, uma mulher forte, morena e cheia de muitos filhos: “Doca”,
“Chaguinha”, Gonzaga, Dototéria, Manoel e muitos outros.
Eram muitos e esqueci-me de
seus nomes, mas acho que eram doze ao todo! Como decorar todos os nomes? Só sei que uma delas estudava na Faculdade em
que fui professor e acho que todos estão formados em nível superior.
Ah, tempos bons em que
corria despreocupadamente pela Rua, empurrando aros de bicicletas, pneus ou
puxando carrinhos cheios de areia que imaginava ser rolo compactador que
dirigia meu padrinho tratorista do extinto Departamento de Estradas e de
Rodagens – DER-Am. Os “brinquedos” eram produzidos por mim mesmo. Todos meus
“compactadores” eram amarrados formando vários compactadores ao mesmo tempo e
presos por arames recozidos. Meu amigo João Couto da Silva, que me acompanhava
nessas aventuras, aonde você andará agora? O que meu padrinho Januário Calado
dirigia só tinha um compactador, mas quem há de entender a mente criativa de
uma criança? Impossível!
Tenho e sinto saudades de
meu amigo de infância João da Silva Couto, que brincava na rua comigo. Cadê
você, meu amigo? Como você deve estar hoje? Talvez como eu: velho, turrão e
cheio de filhos! Nem sei se você continuou seus estudos, amigo, mas tenho
saudades mesmo assim porque a vida continua até ao seu fim!
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